Nascido Delmirense, da safra de 1982. Usa por vezes o pseudônimo de Antônio Oitibó, e quando, entre um cálice de vinho e outro, sente aquecido o arcabouço, diz para os amigos — “Faço o mesmo serviço do Lineu. Me surpreendo e aprendo, como historiador de formação. Me emociono com sambas, folks, blues e rocks. Arranho um violão. No underground literário, dou umas cacetadas na língua portuguesa, lendo e escrevendo, e quando dá, vejo o Flamengo, ou o Brasil jogando”. Disse ainda que neste percurso, escreveu três livros de poemas, um romance e um livro de contos, desde o ano 2000. Publicou-se alguns dos seus versos na revista italiana Utsanga, na Revell (revista de estudos literários da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul/UEMS) e na Revista de Educação da Universidade Guarulhos (UNG-Ser). Quando perguntamos para onde vai, durante suas caminhadas, ele nos diz: “Vou na caminhada da evolução do Para Onde.” Ambientalista de espírito. Poeta maldito pela potência da vontade, é assim com esse release que Maik Oliveira bate esse papo com a Bacurau.


Bacurau: Mayk você se dedicado a fazer produções culturais nos últimos anos principalmente na cena underground, o que mudou de lá pra cá?

MO - A popularização da internet está diretamente ligada a grande mudança para realização do undergound que existe dependente de cenas e movimentos. O cenário do mundo em mudanças do fim de 1990 é o contexto mais amplo das duas últimas décadas do século passado sintetizado a partir da palavra chave globalização,  momento que como se sabe os fluxos internacionais de comércio cultura imigrações e mídia intensificaram-se rearticulando as culturas locais entre si e com o mundo global e ao mesmo tempo problematizando sobremaneira noções fundadoras da modernidade tais como estado-nação das comunidades com laços estabelecidos a partir de bases territoriais e das identidades um pouco mais fixas e estáveis. A ideia de cena foi pensada para tentar dar conta de uma série de práticas sociais econômicas tecnológicas e estéticas ligadas aos modos como a música se faz presente nos Espaços urbanos Isso inclui processos de criação circulação e consumo além das relações sociais afetivas e econômicas decorrentes desse fenômeno. Hoje, temos delineado melhor essas contradições. Se por um lado existe uma movimentação na produção de eventos e materiais por outro não há um suporte bem marcado para captação financeira o que faz que alguns artistas não possam se dedicar inteiramente à sua arte e nem dela possa viver. O crescimento dos Artistas Independentes da indústria fonográfica, que já vinha lutando contra pirataria, que vêm afetando sensivelmente sua rendimentos, tem a sua força justamente pelo motivo contraditório que foi a troca de arquivos e a popularização da banda larga. Se para um sistema foi a crise inevitável dele renasceu novas possibilidades. Logo o cenário apontava para a diminuição das vendas e consequentemente uma diminuição significativa do poder de investimento das gravadoras, ou seja, se antes já era difícil para um artista ou banda lançar um disco por uma grande gravadora agora essa possibilidade encontrava-se mais longe. O que hoje se percebe é que a internet reconfigurou essas práticas ao mesmo tempo que as práticas de consumo musical digitais crescem o consumo de fonograma sem suportes físicos. O CD e vinil resistem e aumenta o rendimento procedentes dos concertos ao vivo, turnês, divulgação pelas redes sociais, nichos e canais de streaming (que repassam uma insignificante receita por meio de visualizações), pela primeira vez mais importantes para a manutenção de uma carreira artisticamente atuante

 

Bacurau: Delmiro sempre foi vanguarda na cena underground alagoana, a que se deve essa vanguarda?

MO - Delmiro guarda semelhança com outras cidades que abrigaram vanguardas. Ela é a reação ao resultado do processo de industrialização que imprime ritmo de padronização que não serve a todos na sociedade. O resultado disso são as críticas através das mesmos instrumentos que a nós eram grilhões.  As contradições na cidade sempre foram gritantes e isso motivava todo forma de insurreição aos modelos estabelecidos. Quando se faz um festival de música e este apresenta hegemonia em apenas um estilo musical, elitista e tradicional, a contrapartida disto é questionar o “porque”. Fazer-se notar, buscar ser ouvido, fazer frente ao que se estabelece apresentando outro discurso, montar uma banda, uma peça de teatro, formatar um festival que caiba o que não foi representado, contradizendo ao que foi imposto é requisito básico para sobrevivência do que está a afrente. As vanguardas nascem para quebrar esses estereótipo pré-estabelecido e normatizador. Interessante é que para que exista essa ruptura o sujeito deve fazer parte desta condição para dela sair. A vanguarda significa, literalmente, a guarda avançada ou a parte frontal de um exército, pioneirismos no fazer de algo. Ruptura extremamente radicais de estéticas e políticas.

 

Bacurau: Você tem se dedicado também a escrita, compondo poemas e desenvolvendo romances, como vê o mercado literário em tempos de e-book e youbook?

MO – Cada formato cria e gera experiências de leitura, memórias e emoções complementares. Nesse contexto, denegrir a leitura de tela ou ouvir audiolivros é contraproducente para o mundo dos livros, pois esses formatos podem ajudar o setor a recuperar leitores ou mesmo criar novos públicos. Um questionamento pertinente é se as Megastore estão falindo, vale a pena publicar por grandes editoras? Nesses mercado temos um modelo de gestão que se coadunam. Por exemplo o Wattpad que é a rede social para quem escreve. A Plataforma consegue agregar leitores sendo uma via para iniciar a carreira literária. Todos buscando retorno para sua produção querendo retorno sobre a escrita. Pessoas que lêem, escreve, e ambas as coisas. Todos buscando retorno para sua produção, querendo retorno sobre a escritores. O wattpad não oferece resposta financeira porém as postagens mais visualizadas estão observadas por "olheiros" de editoras que se movimentam para alinhar contratos. Mas Amazon, traz uma lógica de mercado. O autor recebe o mínimo porém quem adquiri pode adquiri várias obras de uma vez. Eles não são concorrentes. São propostas e modelos de qualificação diferentes de leitores. Wattpad mantém a cerne de comunidade pois a inteiração se mantém pessoias e personalizadas. Os comentários são no formato de resenhas. Dificilmente uma editora vai atrás do escritor que disponibiliza na Amazon. Já no wattpad há inclinação das editoras propondo um contrato baseado na expectativa e porcentagens das visualizações. Nesse espaço se desenvolveu as Fanfics. As fanfics (abreviação de fan fictions) são histórias criadas por fãs de determinados livros, séries ou sagas, utilizando os mesmos personagens, porém com alterações no enredo.

 

Bacurau: Como vê a nova safra de escritores das repúblicas das Alagoas?

MO - A efervescência literária desponta como a surpresa mais significativa da área cultural nesses últimos tempo. A experiência que participo desde 2013 só ganha força a cada ano com "nascimento" de escritores nos mais diversos gêneros literários. Poetas, contistas, prosadores e cordelistas em profícua produção fazendo as receitas cada vez mais saborosas. Não posso deixar de anotar que com o estabelecimento da editora Parresia, baseada no sertão em oposição ao grande centro, o contato com os escritores tem se multiplicado assim como as histórias de livros engavetados que há tempos esperam uma oportunidade para "nascerem". Isso se deve em certa medida ao mesmo movimento de virada de século quando da virada de tecnologias. Hoje todos que possuem algum perfil em redes sociais já são produtores de conteúdo. A forma de se expressar menos onerosa que existe nos traz um tipo de experiência de aprendizado e feedback. Uma opinião, um comentários, um meme, uma gosto que é exposto, uma fotografia ou o compartilhamento de ideias e gestos, uma receita bem sucedida de comida ou drink generoso são portas de possibilidades a serem exploradas por todos. Uma habilidade que se destaca nessa variedade de trabalhos e manifestações trazem expectativas reais de investimento e produção.  Outro fato que tem bastante influência para multiplicação dos escritores está atrelado ao fato do acesso na educação superior e ao maior contato com o mundo leitura, seja por obrigação dos seus currículos, seja pela busca deliberativa deste aluno. O contato com a produção humanística e seu entendimento subjetivo inevitavelmente motiva as pessoas a se expressar dando continuidade à dos aspectos fundamentais do avanço humano, comunicar-se transmitindo conhecimento.

 

Bacurau: A Efervescência cultural dos anos 80/90 cimentou o novo underground dos anos 2000, antes tínhamos mais artistas engajados nas causas culturais e sociais, porém vemos atualmente alguns artistas (que vieram inclusive do underground) caminhando de mãos dadas com o conservadorismo e o bolsonarismo negacionista, acha que essa galera aprendeu alguma coisa?

MO - Questões de ordem ideológica sempre assombraram a arte. Toda geração, de um jeito ou de outro, acaba se envolvendo em polêmicas sobre definições políticas e a necessidade ou não de se engajar em querelas partidárias. Se por um lado há exemplos em abundância de artistas identificados à esquerda, por outro não faltam aqueles de pensamento conservador, muitos deles francamente reacionários filiados a uma linhagem de artistas espirituosos e politicamente incorretos. Outros foram ainda mais longe no espectro direitista, ora revelando-se fascistas antissemitas, ora despudorados racistas. Mas os artistas vindo do underground que se tornam reacionários visam uma tendência elitista típica do liberalismo. A questão do "eu" contra a ideia de classe é totalmente nociva para cena, inclusive sendo oposta ao movimento e sua gênese. A ausência de dois aspectos podem trazer o norte a esse entendimento. Faltam-lhes ética e técnica. A técnica do ponto de vista de serem artistas resumidos à visão arte elitista e dominante o que os fazem julgar apenas o seu trabalho e os dos semelhantes como arte ou cultura. Cultura na sua definição mais equivocada pois a confundem com tradição. Já o aspecto ético se apresenta quando esse artista transfere todos os problemas, dificuldades ou infortúnios aos aspectos morais. Buscam ser reconhecidos como superiores criando assim um tipo de uma nova elite que por sua vez querem privilégios e não direitos. Não compreendem que a arte assim como a liberdade e os direitos devem ser tomados para si por meio da luta. Devem ser reivindicados com veemência. A espera pelo reconhecimento não virá apenas pela execução da arte tradicional e sim pela insistência em garantir permanentemente seu lugar social. Essa estagnação também é motivada pelo liberalismo que vê apenas como exaurir financeiramente os artistas e deles tirar o máximo de lucro. Resumindo, falta aos artista reacionários entender que os direitos e espaços são iguais a partir do momento que entenderem a pluralidade das manifestações se unido nessa busca pela justiça social e não esperando adquirir privilégios (que são o câncer da nação) e que essa noção é herança maldita do sistema administrativo português, o que até hoje se sobre põe aos diretos da nação. Eticamente, não interessa em cultura vindo dessas pessoas, apenas a conservação das elites as quais são lhe representam como ideal.

 

Bacurau: O ano de 2020 foi o chamado “ano perdido” para a cultura devido a pandemia do COVID-19, em sua opinião, qual será o aprendizado que a classe cultural teve nesse processo?

MO - Aprendemos antes de tudo o quanto é importante a arte ou as artes para sociedade. Não resumida como forma de entretenimento mas como necessidade orgânica dos sujeitos. Podemos comparar as diferentes produções, aprendemos como articular nossas manifestações artísticas. Podemos evidencia sobretudo onde se encontravam as deficiências de veiculação do material produzido. Vimos excessos e expressões que estavam politicamente corretas e também seu oposto. Quase que instantaneamente elas poderam ser, discutidas e corrigidas. Vimos quanto ainda precisamos de organização via auxilio emergencial. Maior aprendizado foi termos experienciado com toda força que somente a classe unidade pode fazer a cultura forte.